Os alimentos são fixados de acordo com o binômio necessidade-possibilidade ou, para parcela da doutrina, segundo o trinômio necessidade-possibilidade-proporcionalidade – ver arts. 1694 e 1695 do Código Civil:
“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§ 1 o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
§ 2 o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.”
De acordo com Milton Paulo de Carvalho Filho (Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Manole, 2016, p. 1832),
Os alimentos deverão ser fixados equitativamente pelo juiz, que atentará para as necessidades daquele que os pleiteia e para os recursos do obrigado. Trata-se do binômio “necessidade do reclamante e possibilidade do devedor”, que deverá ser observado pelo julgador para fixar a verba alimentar. A utilização do critério da proporcionalidade entre essas duas variáveis permitirá ao juiz estabelecer uma prestação alimentícia de forma racional e equilibrada, sem excessos nem deficiências.
Para Carlos Eduardo Nicoletti Camillo (Comentários ao Código Civil artigo por artigo. São Paulo: RT, 2009, p. 1988) a análise do binômio é uma equação a ser aplicada a cada caso concreto, pelo magistrado. Não fixa a lei, portanto, um quantum específico a título de alimentos, variando o montante dos alimentos segundo as necessidades do alimentado e as possibilidade do alimentante.
Todavia, quando estamos diante de pedido de alimentos entre ex-cônjuges não somente esses fatores devem ser aferidos ou analisados.
Registre-se, por oportuno, que segundo Rolf Madaleno (Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 996-997) “os alimentos entres esposos é direito cada vez mais escasso nas demandas judiciais, e nessa linha tem se direcionado o STJ considerando que, em regra, todos os alimentos entre cônjuges e conviventes são transitórios, especialmente em decorrência da propalada igualdade constitucional dos cônjuges e gêneros sexuais.”
Em linhas gerais, o Superior Tribunal de Justiça entende que os alimentos aos ex-cônjuges devem ser estabelecidos, por prazo certo, a permitir ao alimentando recolocar-se no mercado de trabalho e prover seu sustento pelo próprio esforço. Possuem, pois, “caráter assistencial e transitório” (AgInt no AREsp 1.487.760/SP, DJe 17/03/2020). Devem ter, portanto, caráter excepcional e transitório, excetuando-se somente esta regra quando um dos cônjuges não detenha mais condições de reinserção no mercado de trabalho ou de readquirir sua autonomia financeira, seja em razão da idade avançada ou do acometimento de problemas de saúde – ver, por exemplo: AgInt no AREsp 1405572/SC, DJE 31/05/2019.
Regra: devem ser estabelecidos, por prazo certo, a permitir ao alimentando recolocar-se no mercado de trabalho e prover seu sustento pelo próprio esforço. Possuem caráter assistencial e transitório.
Exceção: não haverá prazo certo se um dos cônjuges não tiver mais condições de reinserção no mercado de trabalho ou de readquirir sua autonomia financeira em razão da idade avançada ou do acometimento de problemas de saúde.
Recentemente, em 10 de março de 2020, a Terceira Turma do STJ (REsp 1.829.295/SC, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 13/03/2020), na linha do que fora decidido no REsp 1.661.127/DF (10.12.2019) reiterou o que dissemos acima: decidiu-se que os alimentos entre ex-cônjuges não são fixados com base apenas no binômio necessidade-possibilidade; outras circunstâncias além do binômio necessidade-possibilidade devem ser analisadas.
Como mencionado, segundo o Tribunal,a pensão entre os ex-cônjuges não está limitada somente à prova da alteração do binômio necessidade-possibilidade, devendo ser consideradas outras circunstâncias, como a capacidade potencial para o trabalho e o tempo decorrido entre o seu início e a data do pedido de desoneração.
A posição da Terceira Turma, não representa, a meu sentir, novidade na jurisprudência do STJ, como alguns sugeriram.
Há algum tempo a jurisprudência daquele tribunal quando lida com o tema – alimentos entre ex-cônjuges – não realiza a fixação somente com base no binômio necessidade-possibilidade; leva-se em consideração os fatores acima apontados: 1) capacidade para o trabalho de quem recebe os alimentos e 2) o lapso de tempo decorrido entre o seu início e a data do pedido de desoneração.
Assim, o olhar na fixação de pensão alimentícia entre ex-cônjuges não se volta apenas para a necessidade de quem recebe e a possibilidade de quem paga, como ocorre nos pedidos, digamos, tradicionais de alimentos. A Corte faz um acréscimo interpretativo quando lida com alimentos ente ex-cônjuges.
Ao decidir sobre alimentos entre ex-cônjuges o STJ “vai além” – digamos assim – da mera análise do binômio necessidade-possibilidade.
No caso examinado pela Terceira Turma, a obrigação alimentar já perdurava por quase 2 (duas) décadas, período que, segundo o recorrente, seria tempo suficiente para que a alimentanda, com plena capacidade de trabalho, encontrasse meios de viver sem seu apoio financeiro. Na situação apreciada, anulou-se a sentença para determinar o retorno do processo à instância de origem para viabilizar a instrução probatória, pois, segundo o STJ, “ao divergiram quanto à necessidade de manutenção da obrigação da prestação alimentar, ambas as instâncias ordinárias firmaram suas convicções baseadas em meras suposições.”
Assim, permanece a posição do STJ sobre o tema, nos alimentos entre ex-cônjuges, além do binômio necessidade-possibilidade, deve-se examinar a capacidade para o trabalho de quem recebe e o tempo decorrido desde o início do recebimento da pensão alimentícia.
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Rodrigo Leite
Coautor do livro “Análise das Divergências Jurisprudenciais no STF e STJ”, Editora Juspodivm. Autor do livro “Tombamento – Vol. 36 – Coleção Leis Especiais para Concursos”, Editora Juspodivm. Autor do livro “Desapropriação – Vol. 39 – Coleção Especiais para Concursos”, Editora Juspodivm. Coautor do livro “Saberes Jurisprudenciais”, Editora Saraiva. Especialista em Direito Público e Direito Processual Civil. Mestre em Direito Constitucional. Aluno laureado das Turmas 2005.2 da Universidade Potiguar. Autor de artigos jurídicos. Máster Universitário em Direito Constitucional pela Universidad Del País Vasco, San Sebastián, Espanha. Advogado licenciado. Assessor de Desembargador do TJRN.
Comments (1)
Adriana Fernandes Vieirasays:
8 de October de 2020 at 18:56Excelente texto, muito esclarecedor