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Recursos contra a prova objetiva de Delegado Paraná

Fez a prova de Delegado Paraná, conferiu o gabarito preliminar e deseja recorrer? Nosso Time de professores preparou fundamentos de recursos para te ajudar. Continue a leitura e confira!

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Post atualizado às 10h50 de 06/10/2021

Cumprindo mais uma vez seu compromisso com os alunos, o Supremo disponibiliza os fundamentos para impugnação de questões e gabaritos da prova objetiva de Delegado Paraná, conforme entendimento de seus professores.

Vale lembrar que cada candidato deve ler as especificações do Edital, para que possa interpor seu próprio recurso. O Supremo não tem legitimidade ativa para interpor qualquer recurso em prol dos candidatos.

De acordo com o site da banca, o prazo para a interposição de recursos será de 12h00min do dia 04/10 até as 11h59min do dia 06/10/2021.

Os professores de Direito Penal, Informática, Direito Administrativo, Direito Civil e Processo Penal verificaram a possibilidade de recurso, conforme abaixo.

Temos muito orgulho de ser um curso que realmente apoia seus alunos em todas as fases e em todos os momentos, até a aprovação. Obrigado pela confiança em nosso trabalho.

DIREITO PENAL – PROFESSOR FRANCISCO MENEZES

1ª QUESTÃO

Enunciado:

“Considere o seguinte caso hipotético: Diante da promessa de ser recompensado por D.D. com um cargo político, A.A. aceitou matar a vítima E.E. Para cometer o crime, A.A. contou com o auxílio de B.B. e C.C., que não tirariam proveito do cargo prometido, mas aceitaram cometer o crime por ter antiga rivalidade política contra E.E. Para a execução do crime, A.A., B.B. e C.C. foram até a casa de E.E. Enquanto C.C. ficou vigiando os arredores, A.A. e B.B. ingressaram na residência da vítima e a esfaquearam até a morte. Posteriormente, a participação de A.A., B.B., C.C. e D.D. foi apurada nos exatos termos descritos acima. A respeito do caso narrado, considere as seguintes afirmativas:

Alternativa apontada como correta:

Somente as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras.

Razões do recurso:

O gabarito oficial apresentava a referida alternativa como correta, contudo, as assertivas 3 e 4 possuem problemas insolúveis, de forma que a assertiva 2 é a única correta, o que deve resultar na anulação da questão. Senão vejamos.

A assertiva 3 diz que o Código Penal brasileiro se orientou pela teoria unitária acerca da autoria, contudo, tal afirmação é atécnica e um tanto quanto incorreta. É bem verdade que o art. 29 do Código Penal adotou a teoria unitária mitigada para determinar a consequência jurídica do concurso de pessoas para a teoria do crime, isto é, a extensão da tipicidade penal para todos os concorrentes. Contudo, para a autoria nosso código se orientou por um sistema diferenciador. Isso porque ao permitir que a sanção seja dosada na medida da culpabilidade de cada concorrente, nossa legislação permitiu que a autoria fosse diferenciada da participação, ainda que apenas quantitativamente. Para isso, a doutrina utiliza a teoria extensiva e restritiva (objetiva) da autoria ou a teoria do domínio do fato. Na abertura do capítulo acerca da autoria, afirma Cézar Roberto Bitencourt:

O conceito de autoria pode abranger todos os intervenientes no crime, quando partimos de um sistema unitário de autor, ou pode estar limitado à conduta dos agentes principais, se partimos de um sistema diferenciador de autor. Neste tópico trataremos, especificamente, da autoria como conceito restrito, nos termos do sistema diferenciador, adotado pela Reforma Penal de 1984. (BITENCOURT, Cézar Roberto. Tratado de direito penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 573).

A assertiva 4 é ainda mais problemática. Isso porque a natureza jurídica da qualificadora enquanto nova elementar do tipo penal ou mera circunstância que influencia a pena não é pacífica na doutrina e nem mesmo na jurisprudência. É verdade que, se qualificadoras representam novas elementares do tipo, a comunicabilidade de tais institutos com os concorrentes seria obrigatória, por força do art. 30 do Código Penal. Contudo, há doutrinadores que afirmam categoricamente que esta não é a natureza das qualificadoras. Nas palavras de Victor Eduardo Rios Gonçalves:

O que causa acalorada discussão no âmbito doutrinário e jurisprudencial é definir se a qualificadora em tela se aplica também ao mandante, pessoa responsável pela contratação do matador. A polêmica, basicamente, gira em torno de se definir se a qualificadora da paga ou promessa de recompensa é ou não elementar do homicídio mercenário, uma vez que o art. 30 do Código Penal dispõe que as circunstâncias de caráter pessoal não se comunicam aos comparsas, salvo se as elementares do crime.

(…)

1ª Corrente – Não se comunica a qualificadora. Para os seguidores desta corrente, deve-se respeitar o entendimento, praticamente pacífico na doutrina, de que elementares são apenas os requisitos essenciais do crime elencados no tipo básico, sendo chamadas de circunstâncias os fatores que alteram o montante da pena, tais como qualificadoras.

(…)

2ª Corrente – Comunica-se a qualificadora ao mandante. Os seguidores desta orientação, embora reconheçam que normalmente qualificadoras são circunstâncias e não elementares, ressaltam que, excepcionalmente, no caso do homicídio mercenário, não há como deixar de reconhecer que o envolvimento do mandante no crime é requisito essencial para sua existência e, na condição de requisito essencial, deve ser considerado elementar. (GONÇAVES, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 97.

            Em arremate, a própria jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça oscila quanto à comunicabilidade da qualificadora relativa ao motivo torpe como se pode observar no seguinte julgado publicado em 2016:

O reconhecimento da qualificadora da “paga ou promessa de recompensa” (inciso I do § 2º do art. 121) em relação ao executor do crime de homicídio mercenário não qualifica automaticamente o delito em relação ao mandante, nada obstante este possa incidir no referido dispositivo caso o motivo que o tenha levado a empreitar o óbito alheio seja torpe. STJ- REsp 1.209.852-PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 15/12/2015, DJe 2/2/2016).

            Por todo o exposto, a questão merece anulação, posto que a única assertiva inequivocamente correta é a número 2.

2ª QUESTÃO

Enunciado:

Sobre tentativa e consumação, considere as seguintes afirmativas:

1. Parte da doutrina entende que a desistência voluntária deve ser também autônoma (determinada por decisão do próprio agente), pois se um fator externo levasse o agente a desistir da execução, a situação descrita no art. 15 do Código Penal não se caracterizaria.

2. O iter criminis corresponde ao desenvolvimento da conduta criminosa e pode ser dividido nas seguintes etapas: cogitação, preparação, execução, consumação e exaurimento, sendo que a cogitação e os atos preparatórios em regra não são puníveis, salvo quando manifestem claramente a intenção de cometer o crime.

3. O arrependimento eficaz se caracteriza quando o agente com eficiência impede o resultado inicialmente almejado, não respondendo, então, pelo crime que pretendia praticar, mas pelos atos já praticados (se por si constituírem crime).

4. A teoria material objetiva distingue os atos preparatórios do início da execução pelo início do ataque ao bem jurídico: tão logo se inicie uma situação de risco para o bem jurídico, a execução começa e a conduta passa a ser punível.

Alternativa apontada como correta:

Somente as afirmativas 1, 3 e 4 são verdadeiras.

Razões do recurso:

O gabarito oficial considera a assertiva 4 como correta. Contudo, no que diz respeito à diferença entre atos preparatórios e atos de execução, há doutrinadores que diferenciam a teoria material objetiva da teoria da hostilidade ao bem jurídico, por mais que, etimologicamente, as teorias possuem origens próximas que remontam aos autores do período neokantistas.

Diferenciando a forma como as duas teorias definem o início de execução, afirma Rogério Greco:

Objetiva-material – Essa teoria busca um complemento da primeira, de natureza formal. Segundo Parma, por intermédio dela se incluem ‘ações que por sua necessária vinculação com a ação típica, aparecem como parte integrante dela, segundo uma natural concepção ou que produzem uma imediata colocação em perigo de bens jurídicos’. Podem ser citados como exemplo da aplicação da mencionada teoria, no homicídio, o fato de apontar a arma para a vítima.

Teoria da hostilidade ao bem jurídico – Era a teoria preconizada por Mayer. Par se concluir pela tentativa, teoria de se indagar se houve ou não uma agressão direta ao bem jurídico (GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte geral. 20. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2018. Grifamos).

Percebe-se que ambas as teorias são fundamentadas na ameaça de lesão ao bem jurídico, porém, ao contrário do que a assertiva 4 apresenta, a teoria objetiva material condiciona o início da execução às ações que se vinculam à conduta típica formando espécie de unidade natural. Tal limitação não se faz presente na teoria da hostilidade ao bem jurídico segundo a qual o início da execução depende apenas do ataque direto ao bem jurídico protegido pela norma incriminadora.

A assertiva 4 está, portanto, incorreta, de forma que a questão deve ser anulada.

INFORMÁTICA – PROFESSOR PABLO LEONARDO

Enunciado:

No sistema UBUNTU v.20.4, no aplicativo Arquivos, uma URL válida para acessar uma pasta compartilhada em um servidor Windows, com as respectivas permissões de acesso, é:

Alternativa apontada como correta:

smb://10.10.1.3/Documentos

Razões do recurso:

Para responder a referida questão, é necessário que o candidato possua prévio conhecimento acerca do Sistema Operacional Windows, afinal de contas, a questão fala sobre um computador com o Linux acessar uma pasta compartilhada no Windows. O anexo I do edital EDITAL Nº 002.2020 trata do conteúdo programático da prova e, na parte de Informática, faz a seguinte referência: “Conceitos básicos de operação com arquivos no sistema operacional Linux (Ubuntu versão 14 ou superior).” Podemos perceber que conceitos acerca de Sistema Operacional Windows, estão fora do escopo do edital e, sendo assim, não poderia ser cobrados na prova de informática. Considerando que não foi citado no edital o ambiente Windows seja em qual for a versão. Considerando que a banca feriu o princípio da vinculação ao instrumento convocatório e extrapolou o edital. Solicito a anulação da questão.

DIREITO ADMINISTRATIVO – PROFESSORA FLÁVIA CAMPOS

Enunciado:

A Lei nº 14.133/2021 promoveu relevantes alterações no tema de licitações e contratos administrativos, inovando, ainda, na disciplina da responsabilização criminal de envolvidos com ilícitos nessas matérias. Sobre o tema, assinale a alternativa correta.

Alternativa apontada como correta:

A admissão de empresa inidônea ou de profissional declarado inidôneo para participar de certame licitatório e, ainda, a celebração de contrato com empresa ou profissional declarados inidôneos constituem crime.

Razões do recurso:

Esta questão teve como ponto de cobrança os crimes praticados em licitações e contratos administrativos, mais especificamente os arts. 337-M, 337-I, 337-G, 337-K e 337-P do Código Penal, artigos que foram inseridos pela nova lei de licitações, Lei 14.133/2021.

Primeiramente, é importante ressaltar que o conteúdo programático de Direito Administrativo previsto no edital não previa a cobrança dos temas licitações e contratos administrativos, o que torna ilícita a cobrança da lei de licitações dentre as questões de Direito Administrativo.

Não se discute que tais dispositivos, por estarem previstos na Parte Especial do Código Penal, poderiam ser cobrados em uma questão de Direito Penal da prova, dentre as 15 questões que o item 9.2.1. estabelece para tal disciplina.

No entanto, não foi o que ocorreu, sendo que a questão foi incluída dentre as questões de Direito Administrativo da prova, o que viola, claramente, o item 9.2.1 do edital, visto que, ao final, a prova ficou com 14 questões de Direito Administrativo e 16 questões de Direito Penal.

Ressalte-se que um importante princípio a ser respeitado na aplicação de concurso público é o princípio da vinculação ao edital, que estabelece que tanto a comissão organizadora quando os candidatos devem respeitar as regras previstas no edital, sendo que o edital do concurso é a norma que rege o concurso, devendo ser rigorosamente cumprido, conforme decisões reiteradas do STF e STJ.

Assim, se o item 9.2.1 do edital prevê 15 questões de Direito Administrativo e 15 de Direito Penal, assim deve ser aplicada a prova, não podendo se confundir disciplinas, descumprindo o número de questões de cada uma delas.

Ainda, caso o tema Licitações e Contratos Administrativos estivesse no conteúdo de cobrança de Direito Administrativo, seria possível a interpretação de que os tipos penais, previstos no Código Penal, poderiam ser cobrados em Administrativo, por terem sido incluídos pela lei 14.133/2021, no entanto, não foi o que ocorreu.

Assim, deve a questão ser anulada, por clara violação ao princípio da vinculação ao edital.

DIREITO CIVIL – PROFESSOR BRUNO ZAMPIER

Comentário geral: em nosso entendimento, há duas questões passíveis de anulação. Vamos aos fundamentos.

1ª QUESTÃO:

Enunciado: Considere o seguinte caso hipotético: Determinada pessoa é constrangida a tratamento médico para curar-se de uma doença grave detectada há vários anos por um médico oncologista. Trata-se de uma moderna técnica cirúrgica, sem comprovação científica e nunca testada em humanos, adotada por um médico em uma cidade no interior do estado do Paraná. O Delegado de Polícia, ao tomar conhecimento do caso, decide instaurar um inquérito para apurar os fatos, tendo em vista que a pessoa que fora obrigada ao tratamento inovador veio a óbito em decorrência desse tratamento.”

Nesta questão, a Banca Examinadora solicitou que o candidato apontasse a assertiva correta.

A alternativa indicada pela banca como sendo a correta, conforme o gabarito preliminar foi: Caso o paciente morto não houvesse deixado nada testado em vida, a decisão sobre a doação de órgãos caberia à família ou aos seus herdeiros”.

Certamente a questão traz uma grande polêmica, consistente no aparente conflito de normas em vigor, uma vez que o Código Civil entra em confronto com a Lei nº 9.434/1997. Esta antinomia entre normas regras, vem sendo destacada há anos pela doutrina. A divergência está exatamente na leitura que deve ser feita destes dois diplomas legais.

O Código Civil de 2002 traz em seus art. 13, 14 e 15 a garantia da autonomia sobre o próprio corpo, sendo certo que cada pessoa natural poderá livremente dispor deste bem da personalidade, desde que respeitados certos limites, como os bons costumes. Ou seja, pela leitura do Código, vê-se que cada sujeito poderá dispor de seu corpo para depois da morte, deliberando sobre tal tema ainda enquanto vivo, sendo tal ato perfeitamente revogável. Logo, pela leitura do Código Civil, a alternativa imputada está realmente correta. A família atuaria apenas de forma subsidiária, na ausência de manifestação do morto.

Todavia, a Lei que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento (Lei nº 9.434/97), em seu art. 4º que: “A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte”. Ou seja, na visão da lei especial sobre o tema da doação de órgãos, há necessidade de coleta do consentimento da família, de todo modo.

A título de exemplo, Nelson Rosenvald, em sua obra “O Direito Civil em Movimento” (Salvador: Editora JusPodium, 2017, p. 89) destaca esta controvérsia, propugnando uma interpretação da lei especial à luz da lei geral, ou seja, defendendo a autonomia do falecido, mas concedendo à família o direito de provar que ele eventualmente tenha se manifestado em sentido contrário ainda em vida. O tema é excelente, para uma prova discursiva; não para uma prova objetiva.

Com a máxima vênia, a falha do enunciado da questão impugnada está na omissão sobre o diploma legal. Bastaria à banca examinadora estipular “aponte a questão correta conforme o Código Civil”. Assim, o gabarito preliminar estaria correto, sem maiores dilemas. Ao deixar em aberto, permitiu ao candidato interpretar conforme os dois diplomas, não havendo alternativa que abordasse a apontada antinomia.

Da forma como foi redigida, infelizmente a questão coloca o candidato em posição de absoluta impossibilidade de resposta, já que não há referência nenhuma aos diplomas regentes da matéria, tampouco à polêmica que se demonstra. O candidato com maiores conhecimentos sobre doação de órgãos e tecidos post mortem está sendo prejudicado, se for mantido o gabarito preliminar.

Desta maneira e com o devido respeito que a banca merece, requer seja ANULADA a presente questão, por faltarem elementos informativos em seu enunciado.

2ª QUESTÃO:

Enunciado: A palavra fato quer dizer acontecido, feito, ocorrido, operado, realizado, sendo o particípio passado do verbo fazer, do verbo latino factio, is, feci, factum, ere. Fato é, assim, todo acontecimento, que pode ser natural, jurídico ou humano, encontrando nesse posicionamento suas três espécies. (AZEVEDO, Álvaro Villaça. Teoria Geral dos Contratos Típicos e Atípicos, 2009, p. 03.). A respeito do assunto, considere as seguintes afirmativas:

1. O fato natural provém da natureza, dispensa a vontade humana e nunca produz efeitos jurídicos, tal como um maremoto em alto mar, na própria natureza, sendo irrelevante para o Direito.

2. Um tsunami que traz danos a uma cidade é um exemplo de um fato natural, não jurídico.

3. O fato jurídico não depende da vontade humana, mas produz efeitos no ordenamento jurídico, como se dá com um fato natural que adentra na órbita de direitos de uma pessoa produzindo um dano.

4. O fato humano é o único que sempre exigirá a manifestação de vontade do sujeito e, por tratarse de verdadeiro ato jurídico, uma de suas formas manifestar-se-á na realização pura e simples da vontade humana..

A questão em comento solicita que o candidato julgue as assertivas de 1 a 4, assinalando quais delas estão corretas. O gabarito preliminar aponta que estariam corretas as assertivas de nº 01, 03 e 04.

O debate trazido na questão é salutar e envolve a classificação dos Fatos Jurídicos, tema que para além da doutrina é abordado também a partir do art. 104 do Código Civil, ao inaugurar o Livro III, da Parte Geral.

Todavia, a assertiva de número 01 trouxe uma redação no mínimo controversa, senão vejamos: ao afirmar que o fato natural provém da natureza, dispensando a vontade humana, a questão está perfeitamente correta. Segundo vasta doutrina, o fato natural é aquele que provém de fenômenos naturais, como o nascimento, a morte, o decurso do tempo, uma tempestade, um furacão, uma nevasca ou qualquer outro evento incontrolável pela vontade humana.

Porém, ao dizer que um evento natural nunca produz efeitos jurídicos, a assertiva incidiu em grave erro. É possível que acontecimento da natureza não gere qualquer dano, qualquer morte, qualquer lesão a direito, modificação, extinção ou criação de direitos subjetivos. Imagine-se uma leve chuva, que não cause nenhum estrago: é fato natural que não se torna fato jurídico. Mas só se chegará a esta conclusão a partir da análise do caso concreto. Jamais em abstrato.

Quando um fato natural produz efeitos jurídicos, a doutrina costuma denomina-lo de fato jurídico em sentido estrito, o que atesta ainda mais a presença da possiblidade de efeitos.

Ao afirmar que um fato natural nunca geraria efeitos jurídicos, a assertiva em comento falha terrivelmente, razão pela qual deve ser considerada como errada.

Inclusive a própria assertiva 02, ao dizer que “um tsunami que traz danos a uma cidade é um exemplo de um fato natural, não jurídico”, foi considerada pela banca examinadora como errada. E está perfeita a banca neste ponto. Um tsunami é um evento natural que, em produzindo danos, é fato jurídico indubitavelmente. Ora, como pode a assertiva 02 estar errada e a assertiva 01 estar certa? Há uma contradição insuperável entre as próprias assertivas da questão.

Logo, resta evidente, com a máxima vênia, que a assertiva 01 ao se valer da expressão “nunca produz efeitos jurídicos”, está errada, razão pela qual a questão merece ser ANULADA por inteiro, em virtude da doutrina remansosa que trata da classificação dos fatos jurídicos.

PROCESSO PENAL – PROFESSORES CRISTIANO CAMPIDELLI E RODRIGO BELLO

1ª QUESTÃO

Enunciado:

T.A. foi processado e julgado por infração ao art. 180, §1º, do Código Penal (receptação qualificada – pena de reclusão de 3 a 8 anos e multa). Ao final, foi condenado a uma pena de 5 anos em regime inicialmente fechado, justificada na reincidência específica. A sentença refutou a tese de insuficiência probatória alegada pela defesa e deixou de apreciar pedido de desclassificação, acatando de forma integral e remissiva os argumentos da acusação expostos nas alegações finais. A partir da narrativa, assinale a alternativa correta

Alternativa apontada como correta:

A defesa de T.A. poderá alegar que a motivação per relationem acarreta a nulidade da sentença por vício de fundamentação

Razões do recurso:

A questão confunde motivação, que é fática, com fundamentação, que é jurídica. A afirmativa acima foi dada como correta pelo gabarito, contudo ela está tecnicamente errada, pois onde consta “motivação per relationem” deveria constar “fundamentação per relationem”. Além disso, a alínea a está correta, pois realmente a sentença “poderá ser anulada” com base no art. 315, § 2º, inciso IV, do CPP. Portanto, diante de erro técnico grave na alternativa apontada como correta e da alternativa A sentença de T.A. poderá ser anulada, pois a motivação deixa de apreciar pedido de desclassificação formulado pela defesa” também estar correta, a questão deve ser anulada.

2ª QUESTÃO

Enunciado:

Nas palavras de Aury Lopes Junior, “o processo penal admite distintas relações configuráveis entre os atos, fazendo com que o processo de conhecimento comporte diferentes ritos, em função da natureza do delito ou mesmo da pessoa envolvida (prerrogativa de função)”. (LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 16 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 723.) A respeito do procedimento comum (ritos ordinário, sumário e sumaríssimo), considere as seguintes afirmativas:

Alternativa apontada como correta:

Somente as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras

Razões do recurso:

O gabarito aponta como esta alternativa como correta, segundo a qual as afirmativas 2, 3 e 4 são verdadeiras. O problema é que a afirmativa 2 apresenta erro material grave, ao dizer que “2. Nos ritos ordinário e sumário, da decisão que recebe a denúncia ou queixa, como regra, não cabe recurso; mas caberá recurso sem sentido estrito da decisão que não as recebe.” A afirmativa estaria correta se dissesse “recurso em sentido estrito” e não “recurso sem sentido estrito” conforme consta da prova. Assim, diante de erro material grave, a questão deve ser anulada. 

3ª QUESTÃO

Enunciado:

A nova lei de abuso de autoridade (Lei 13.869/19) trouxe inovações consideráveis. A legislação anterior, existente desde 1965, visava exclusivamente o Poder Executivo. Com a novel legislação, membros do Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e de Tribunais ou Conselhos de Contas também podem ser alvos de penalidades. Sobre a lei de abuso de autoridade, considere as seguintes afirmativas:

Alternativa apontada como correta:

As afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras.

Razões do recurso: O gabarito aponta esta alternativa como correta, segundo a qual as afirmativas 1, 2, 3 e 4 são verdadeiras. Contudo, a afirmativa 3 está incorreta, pois para que possa haver “a perda do cargo do serventuário ou autoridade e a inabilitação para a retomada ao serviço público por um prazo de até 5 anos”, não basta que se trate de um caso de reincidência, uma vez que a lei expressamente exige “reincidência em crime de abuso de autoridade”, ou seja, exige-se reincidência específica e não apenas reincidência genérica como mencionado na afirmativa. Diante do erro grave, a questão deve ser anulada.

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