Cumprindo mais uma vez seu compromisso com os alunos, o Supremo disponibiliza os fundamentos para impugnação de questões e gabaritos da prova objetiva de Delegado de Polícia Civil de Santa Catarina, realizada no domingo dia 28 de janeiro de 2024, conforme entendimento de seus professores.
Vale lembrar que cada candidato deve ler as especificações do Edital, para que possa interpor seu próprio recurso. O Supremo não tem legitimidade ativa para interpor qualquer recurso em prol dos candidatos.
Temos muito orgulho de ser um curso que realmente apoia seus alunos em todas as fases e em todos os momentos, até a aprovação.
Não só na formulação de recursos, mas também acertando em diversos pontos que caíram nas provas durante as aulas e nos eventos “Hora H”. Obrigado pela confiança em nosso trabalho.
Este artigo poderá ser atualizado a qualquer momento, caso nossos professores entendam haver novos fundamentos recursais contra o gabarito preliminar.
PROF. CRISTIANO CAMPIDELLI E PROF.ª CAROLINA MÁXIMO
DIREITO PROCESSUAL PENAL
QUESTÃO 51
ENUNCIADO: Demétrio é investigado e indiciado pela prática do crime de receptação qualificada […]
RAZÕES DE RECURSO DA QUESTÃO 51 DA PROVA TIPO 1 – BRANCA DE DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA
( ) No curso do inquérito policial, conforme a disciplina do Código de Processo Penal, o imputado deve ser ouvido e não interrogado. Todavia, as declarações prestadas pelo investigado devem ser regidas pelas normas processuais relacionadas ao interrogatório judicial.
Considerando que o gabarito preliminar para a questão é a letra A, a qual considera a assertiva acima como verdadeira, a questão deve ser anulada.
Aparentemente, o examinador fez uma interpretação literal do disposto no art. 6º, inciso V, do Código de Processo Penal, desconsiderando a menção expressa ao interrogatório constante do art. 304 do mesmo Codex:
Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
(…)
V – ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura;
CPP, Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
Vale lembrar que o inquérito policial pode ser iniciado por portaria ou auto de prisão em flagrante delito (APFD), o que dependerá da existência ou não de situação flagrancial, razão pela qual o interrogatório feito durante a lavratura do APFD é um interrogatório feito no curso do inquérito policial. Assim, a simples leitura do art. 304 do CPP já demonstra o erro da questão.
Além disso, uma vez formalizado o indiciamento do imputado, sua oitiva é realizada na forma de interrogatório, o que se depreende do disposto no art. 7º, inciso XXI, da Lei nº 8.906/1994:
Art. 7º São direitos do advogado:
(…)
XXI – assistir a seus clientes investigados durante a apuração de infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração:
a) apresentar razões e quesitos;
Na doutrina, ao tratar da oitiva do investigado no inquérito policial, Marcão expressamente diz que “o interrogatório, que será reduzido a termo (documentado; formalizado) e por todos assinado, deve materializar-se em conformidade com o disposto nos arts. 185 a 195 do CPP, cumprindo nesse passo relembrar que: a unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações” (Marcão, Renato. Curso de processo penal. 8. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 71, e-book).
No mesmo sentido, Lopes Júnior, ao tratar do direito de defesa e contraditório no inquérito policial, expressamente afirma “a possibilidade de o indiciado exercer no interrogatório policial sua autodefesa positiva (dando sua versão aos fatos); ou negativa (usando seu direito de silêncio)” (Lopes Júnior, Aury. Direito processual penal. 20. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 85).
Nessa mesma linha, Dezem leciona que “com o indiciamento são tomadas uma série de condutas por parte da autoridade policial”, dentre as quais expressamente menciona o “interrogatório do indiciado” (Dezem, Guilherme Madeira. Curso de processo penal. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 259).
Não há dúvidas, portanto, que à luz de uma interpretação sistêmica da legislação processual penal e da doutrina, há sim realização de interrogatório no curso do inquérito policial.
QUESTÃO 46
ENUNCIADO: A estrutura de garantias constitucionais organizada para manter firme o axioma Nulla poena sine probatione exige dos Poderes Públicos, sobretudo do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos organismos policiais, […]
GABARITO PRELIMINAR: Letra “A” (V – V – V).
RAZÕES DE RECURSO DA QUESTÃO 46 DA PROVA TIPO 1 – BRANCA DE DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA
( ) O reconhecimento fotográfico pode ser considerado um meio de prova irritual, pois colhida sem a observância dos elementos ou modelos previstos em lei.
( ) O reconhecimento de pessoas, por sua natureza, consiste em prova irrepetível.
Considerando que o gabarito preliminar da questão aponta a letra A como correta, a qual considera as assertivas acima como verdadeiras, a questão deve ser anulada.
A primeira assertiva combatida afirma que “o reconhecimento fotográfico pode ser considerado um meio de prova irritual, pois colhida sem a observância dos elementos ou modelos previstos em lei.”
Segundo Lima, prova irritual é “a prova típica colhida sem a observância do modelo previsto em lei”, tratando-se de prova ilegítima (Lima, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 9. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2021, p. 570).
Nesse mesmo sentido, Dezem ensina que “a prova irritual não é produzida segundo o modelo legal. Em verdade, utiliza-se o meio adequado, mas sem a observância dos elementos típicos previstos em lei”, sendo que a sua utilização gera no processo “a nulidade ou a ilicitude da prova” (Dezem, Guilherme Madeira. Curso de processo penal. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 705).
Contudo, tais raciocínios não se aplicam ao reconhecimento fotográfico, que é meio de prova reconhecidamente válido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, desde que realizado conforme o previsto no art. 226 do Código de Processo Penal e corroborado por provas produzidas em juízo:
PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO. NULIDADE. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO. AUTORIA CORROBORADA POR OUTRAS PROVAS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. “O reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (HC n. 598.886/SC, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 27/10/2020, DJe 18/12/2020).
2. Na hipótese em análise, o reconhecimento fotográfico do acusado em nível policial foi ratificado em juízo pela vítima de forma precisa, observando-se o contraditório e a ampla defesa. Precedentes.
3. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no HC 664.416/SC, 6ª T, J. 23/11/2021)
(…) 1. Para a jurisprudência desta Corte Superior, o reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto para identificar o réu e fixar a autoria delitiva quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal (HC n. 598.886/SC, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 18/12/2020). O art. 226, antes de descrever o procedimento de reconhecimento de pessoa, diz em seu caput que o rito terá lugar “quando houver necessidade“, ou seja, o reconhecimento de pessoas deve seguir o procedimento previsto quando há dúvida sobre a identificação do suposto autor. Se a vítima é capaz de individualizar o agente, não é necessário instaurar a metodologia legal. (…) (STJ, AgRg no HC 769.478/RS, 5ª T, J. 25/04/2023)
(…) 4. Em julgados recentes, ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça alinharam a compreensão de que “o reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (HC 652.284/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 27/4/2021, DJe 3/5/2021) (…)” (STJ, AgRg no HC 844.41/PE, 5ª T, J. 18/12/2023).
Além disso, em complementação ao disposto no art. 226 do Código de Processo Penal, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 484, de 19 de dezembro de 2022, que disciplinou, de forma exaustiva, o procedimento a ser observado para a realização do reconhecimento fotográfico, espancando de vez a possibilidade de considerá-lo uma prova irritual, pois agora, mais do que nunca, há elementos típicos do modelo legal a ser seguido previstos em fonte formal do processo penal.
A segunda assertiva combatida afirma que “o reconhecimento de pessoas, por sua natureza, consiste em prova irrepetível.”
De fato, a supracitada Resolução nº 484, de 19 de dezembro de 2022, em seu art. 2º, § 1º, dispõe que “o reconhecimento de pessoas, por sua natureza, consiste em prova irrepetível, realizada uma única vez, consideradas as necessidades da investigação e da instrução processual, bem como os direitos à ampla defesa e ao contraditório.”
Tal resolução teve por norte, dentre outras fontes, o voto do Ministro Rogerio Schietti Cruz, no julgamento do Habeas Corpus nº 712.781/RJ, segundo o qual “o reconhecimento de pessoas é considerado como uma prova cognitivamente irrepetível” (STJ, HC 712.781/RJ, 6ª T, J. 15/03/2022).
Não obstante, há decisões posteriores e em sentido diverso, tanto do Supremo Tribunal Federal, quanto do próprio Superior Tribunal de Justiça:
(…)
2. Constou ainda da sentença que “a ofendida reconheceu, desde o início das investigações, os réus Diego e Anderson como sendo os autores do fato, o que foi confirmado em juízo”.
3. “A jurisprudência desta Suprema Corte entende que o reconhecimento fotográfico ratificado em juízo, sobretudo quando corroborado por outros elementos colhidos sob o crivo do contraditório, constitui meio de prova idôneo hábil a lastrear o decreto condenatório. Precedentes” (HC nº 215.160-AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 15/6/22).
4. A parte agravante limitou-se a reiterar os argumentos expostos na inicial da presente impetração, não apresentando elementos capazes de afastar os fundamentos da decisão agravada. 5. Agravo regimental ao qual se nega provimento (STF, HC 217.826 AgR/RS, 1ª T, J. 03/10/2022).
(…) 4. Embora o reconhecimento fotográfico perante a autoridade policial, por si só, não seja idôneo para embasar uma condenação, não é procedimento ilegal nem contamina os demais atos, em especial quando, “sob o crivo do contraditório e sem apresentação de qualquer impugnação pelos seus respectivos defensores durante a realização do procedimento, houve ratificação dos reconhecimentos feitos na fase inquisitória”. Com efeito, o funcionário da loja onde o cartão da vítima foi utilizado “reconheceu seguramente ambos na fase pré-processual e em juízo“. – Ademais, consta do vasto conjunto probatório juntado aos autos que o paciente foi indicado pelos demais corréus, não havendo se falar em fragilidade de provas nem em perda de chance probatória. Nesse contexto, não obstante eventual não observância do art. 226 do Código de Processo Penal, não é possível desconsiderar as particularidades do caso concreto, em especial as seguras declarações do funcionário onde o cartão da vítima foi usado, tanto em sede inquisitorial quanto em juízo (STJ, AgRg no HC 864.786/SP, 5ª T, J. 11/12/2023).
Não há dúvidas, portanto, de que a questão deve ser anulada, tanto porque a primeira assertiva combatida não encontra respaldo na melhor doutrina e jurisprudência, quanto porque a segunda assertiva combativa questionou de forma objetiva tema que é controverso na jurisprudência do STF e do STJ.
QUESTÃO 49
ENUNCIADO: Garantia constitucional de proteção da liberdade de locomoção, o habeas corpus é instrumento jurídico que possui contornos específicos no sistema processual penal. […]
RAZÕES DE RECURSO DA QUESTÃO 49 DA PROVA TIPO 1 – BRANCA DE DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA
IV. De acordo com o Código de Processo Penal, o pedido de informações à autoridade coatora é facultativo, exceto no caso de habeas corpus de competência originária dos tribunais.
Considerando que o gabarito preliminar da questão aponta a letra B como correta, a qual considera a assertiva acima como verdadeira, a questão deve ser anulada.
Analisando a assertiva, verifica-se que ela menciona que, de acordo com o Código de Processo Penal, o pedido de informações à autoridade coatora é facultativo, exceto no caso de habeas corpus de competência originária dos tribunais, ou seja, nesta última hipótese (competência originária dos tribunais), segundo a assertiva, o pedido de informações à autoridade coatora não seria facultativo, mas sim obrigatório.
No entanto, o Código de Processo Penal, em seus artigos 661 e 662, apresenta textos que contrariam a combatida assertiva:
Art. 661. Em caso de competência originária do Tribunal de Apelação, a petição de habeas corpus será apresentada ao secretário, que a enviará imediatamente ao presidente do tribunal, ou da câmara criminal, ou da turma, que estiver reunida, ou primeiro tiver de reunir-se.
Art. 662. Se a petição contiver os requisitos do art. 654, § 1º, o presidente, se necessário, requisitará da autoridade indicada como coatora informações por escrito. Faltando, porém, qualquer daqueles requisitos, o presidente mandará preenchê-lo, logo que Ihe for apresentada a petição.
Da leitura dos dispositivos resta claro que, de acordo com o Código de Processo Penal, em caso de competência originária do Tribunal de Apelação, a requisição de informações da autoridade indicada como coatora será feita “se necessário”, ou seja, de forma não obrigatória, portanto facultativa.
Na doutrina, ao tratar do processamento do habeas corpus no segundo grau de jurisdição, por mais que sustente a importância de se requisitar informações da autoridade apontada como coatora, Marcão deixa claro que a medida é facultativa:
Com ou sem aditamento, o Relator poderá conceder a ordem liminarmente, de modo a fazer cessar ou impedir o constrangimento ilegal tratado nos autos, providenciando para tanto as comunicações necessárias.
Na sequência, também o Relator poderá requisitar informações por escrito da autoridade apontada como coatora, a respeito das imputações contidas na petição inicial. Muito embora o art. 662 do CPP apenas faculte a requisição de informações (se necessárias…), quer nos parecer que tal providência é de grande utilidade, daí por que ser sempre (ou quase sempre) recomendada, até mesmo para o fim de verificar se o alegado constrangimento cessou, hipótese em que o tribunal deverá julgar prejudicado o pedido. Exemplo: o juiz decreta a prisão preventiva do réu, que após alguns dias de prisão ingressa com habeas corpus no Tribunal de Justiça alegando falta de fundamentação adequada, e antes do julgamento do writ o juiz reconsidera sua decisão e coloca o réu em liberdade.
Recebidas as informações (quando requisitadas, evidentemente), segue-se com a abertura de vista dos autos ao Ministério Público em segundo grau para que se manifeste no prazo de dois dias, tal como preceitua o art. 1º do Decreto-Lei n. 552/69 (Marcão, Renato. Curso de processo penal. 8. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 517, e-book).
Das expressões utilizadas pelo autor, tais como “poderá”; “apenas faculte”; “de grande utilidade”; “recomendada”; “quando requisitada, evidentemente”; resta claro que o pedido de informações à autoridade coatora é facultativo, mesmo no caso de habeas corpus de competência originária dos tribunais.
No mesmo sentido, Lopes Júnior, ao tratar do procedimento do habeas corpus, expressamente afirma que “o pedido de informações deve ser formulado ‘se necessário’, portanto, a regra é que o HC que preencha os requisitos do art. 654 seja despachado sem a manifestação do juiz coator”, bem como que “quando o writ vier instruído com cópia integral do processo e preencher os requisitos formais, não há ‘necessidade’ alguma do pedido de informações” (Lopes Júnior, Aury. Direito processual penal. 20. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023, p. 519, e-book).
Nessa mesma linha, Dezem leciona que “o pedido de informações é facultativo (art. 662 do CPP)” (Dezem, Guilherme Madeira. Curso de processo penal. 8. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 1.453).
Não há dúvidas, portanto, de que à luz do disposto no Código de Processo Penal e do que ensina a doutrina, a questão deve ser anulada.
PROF.ª FLÁVIA CAMPOS
DIREITO ADMINISTRATIVO
Prova Tipo 1 – Questão 60
A questão em análise afirma que a perspectiva pragmática apresenta peculiaridades marcantes, cujo debate tem se intensificado no âmbito do direito administrativo, notadamente após as alterações promovidas pela Lei 13.655/2018 no Decreto-Lei 4.657/42 (LINDB). Com base nesse contexto, é exigido que o candidato assinale a alternativa que apresenta os eixos ou axiomas da perspectiva pragmática, considerando a doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Foi considerada como correta a alternativa (C), que apresenta como eixos: antifundacionismo, contextualismo e consequencialismo.
No entanto, a alternativa não deve ser considerada correta, pelos três motivos apresentados abaixo.
- A questão, como se depreende do enunciado, se baseia em entendimento doutrinário, assim como em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Esses axiomas que devem nortear a atuação do Poder Judiciário são citados em decisão monocrática no julgamento da Ação Originária 1773 / DF, de relatoria do Ministro Luiz Fux. Isso, por si só, já ensejaria a discussão se seria “jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, visto que, para fins de concurso público, devem ser consideradas decisões reiteradas do Tribunal, e não apenas uma decisão monocrática e única.
- No entanto, ainda que considerada a decisão do Supremo Tribunal Federal, o respeitável Ministro Luiz Fux cita como axiomas que devem nortear a decisão do Poder Judiciário: o ANTIFUNDACIONALISMO, o contextualismo e o consequencialismo. Já a alternativa considerada correta traz expressamente ANTIFUNDACIONISMO, ou seja, expressão diferente da citada na decisão referida. Da mesma maneira, a Resolução 75/2009, que estabelece sobre os concursos públicos para magistratura no país, prevê, dentro do tema Noções gerais de direito e formação humanística (e não de Direito Administrativo), o item “Função judicial e pragmatismo. ANTIFUNDACIONALISMO. Contextualismo. Consequencialismo. Racionalismo e Empirismo. Dialética. Utilitarismo”. ortanto, a questão deveria trazer o termo correto, qual seja, “antifundacionalismo” e não “antifundacionismo”.
- Por fim, ainda que a questão trouxesse o termo usado corretamente, qual seja, antifundacionalismo, o termo, por si só, é criticado por estudiosos do assunto. Rachel Herdy e Janaina Matilda afirmam que “(…) um segundo (e talvez mais preocupante) problema diz respeito à ideia de antifundacionalismo propriamente. Com efeito, não é possível saber ao certo a literatura que Fux tinha em mente quando afirmou que o pragmatismo está alicerçado no antifundacionalismo. (…) Assim como pragmatismo, antifundacionalismo é uma palavra sujeita a equivocações. O sentido que Pogrebinschi trabalha em seu livro é diferente dos muitos sentidos empregados por Rorty; e ambos, por sua vez, também não condizem inteiramente com o sentido em que o conceito é consistentemente empregado nos manuais de Epistemologia”. As autoras ainda afirmam que, em virtude dessa polissemia do termo “antifundacionalismo”, um controle judicial que nele se fundamente seria, inevitavelmente, levado a erro: “A falta de reconhecimento do conceito de verdade como correspondência à realidade que está presente na postura de um tomador de decisão antifundacionalista pode torná-lo cúmplice dos erros judiciários. Logo, para salvar a resolução do CNJ, só faz sentido ensinar antifundacionalismo para os juízes se for para ensinar “o que eles não devem ser”. Fonte: CNJ pode dificultar formação de juízes na tradição racionalista da prova. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2021-out-22/limite-penal-cnj-dificultar-formacao-juizes-tradicaoracionalista-prova
Sendo assim, pelos motivos acima apresentados, a questão em análise deve ser anulada, por não considerar corretamente os axiomas citados pelo Supremo Tribunal Federal.
PROF.ª LUCIANA GAZZOLA
MEDICINA LEGAL
Sem possibilidade de recursos.
PROF. BRUNO ZAMPIER
DIREITO CIVIL
Sem possibilidade de recursos.
Comments (2)
Dawson Belli de Aguiarsays:
31 de January de 2024 at 20:53E A DE PENAL A 13 DA PROVA1 NAO CABE RECURSO?
Dawson Belli de Aguiarsays:
31 de January de 2024 at 20:53Português não cabe nenhuma?